terça-feira, 29 de novembro de 2011

eu como um lugar mal situado


Homens que são como lugares mal situados
Homens que são como casas saqueadas
Que são como sítios fora dos mapas
Como pedras fora do chão
Como crianças órfãs
Homens agitados sem bússola onde repousem

Homens que são como fronteiras invadidas
Que são como caminhos barricados
Homens que querem passar pelos atalhos sufocados
Homens sulfatados
Por todos os destinos
Desempregados das suas vidas

Homens que são como a negação das estratégias
Que são como os esconderijos dos contrabandistas
Homens encarcerados abrindo-se com facas

Homens que são como danos irreparáveis
Homens que são sobreviventes vivos
Homens que são sítios desviados
Do lugar

....

Homens que são como projectos de casas
Em suas varandas inclinadas para o mundo
Homens nas varandas voltadas para a velhice
Muito danificados pelas intempéries
Homens cheios de vasilhas esperando a chuva
Parados à espera
De um companheiro possível para o diálogo interior


Homens muito voltados para um modo de ver
Um olhar fixo como quem vem caminhando ao encontro
De si mesmo
Homens tão impreparados tão desprevenidos
Para se receber

Homens à chuva com as mãos nos olhos
Imaginando relâmpagos
Homens abrindo lume
Para enxugar o rosto para fechar os olhos
Tão impreparados tão desprevenidos
Tão confusos à espera de um sistema solar
Onde seja possível uma sombra maior

...

Não levantemos os homens que se sentam à saída
Porque se movem em seus carreiros interiores
Equilibram com dificuldade uma ideia
Qualquer coisa muito nítida, semelhante
A uma folha vazia
E põem ninhos nas árvores para se libertarem
Da gaiola terrível, invisível muitas vezes
De tão dura
Não nos aproximemos dos homens que põem as mãos nas grades
Que encostam a cabeça aos ferros
Sem outras mãos onde agarrar as mãos
Sem outra cabeça onde encostar o coração
Não lhes toquemos senão com os materiais secretos
Do amor.
Não lhes peçamos para entrar
Porque a sua força é para fora e a sua espera
É a fé inabalável no mistério que inclina
Os homens por dentro
Não os levantemos
Nem nos sentemos ao lado deles.
Sentemo-nos
No lado oposto, onde eles podem vir para erguer-nos
A qualquer instante


Daniel Faria, “HOMENS QUE SÃO COMO LUGARES MAL SITUADOS”, 1998

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

pequeno-almoço em Beirut



German Phenomenology Makes Me

Want to Strip and Run through North London


Page seven - I’ve had enough of Being and Time

and of clothing. Many streakers seek quieter locations

and Marlborough Road’s unreasonably quiet tonight.

If it were winter I’d be intellectual, but it’s Tuesday

and I’d rather be outside, naked, than learned -

rather lap the tarmac escarpment of Archway Roundabout

wearing only a rucksack. It might come in useful.

I can’t take any more of Heidegger’s Dasein-diction,

I say as I jettison my slippers.

When I speak of my ambition

it is not to be a Doctor of Letters

or to marry Friedrich Nietzsche, it turns out,

or to think better.

It is to give up this fashion for dressing.

It is to drop my robe on the communal stairs

and open the front door onto the commuter hour,

my neighbour, his Labrador, and say nothing

of what I know or do not know, except what my body announces.


Heather Phillipson

poema roubado ao Faber new poets 3, Faber & Faber