terça-feira, 17 de março de 2009

estática #5

– e tu?
– a vida agora corre sem perigos. sozinhos achámo-nos mais capazes. e estar triste… estar triste sem testemunhas não serve para nada.
– mas e tu?
– hoje sim, estou contente. amanhã logo vejo.
– sim, e tu?
– se quisermos ser justos é ainda mais difícil porque não somos.
– não. e tu?
– podemos ser mais que suficientes para várias pessoas, mas nunca chegamos para uma só. nunca.
– mas e tu?
– é imperativo mudar de supermercado.
– e tu?
– mas isso não importa, pois não? o que importa é o que há-de vir e essas coisas todas.

sexta-feira, 13 de março de 2009

estática #4

- Ouve, ouve, hoje descobri uma coisa.
– O quê?
– Quando não olhas para as pessoas, elas deixam de existir.

sábado, 7 de março de 2009

estática #3

– Mas e depois?
– Depois nada.
– Como assim, nada?
– Ele precisava de dizer coisas. E ela de esquecer o que ele dizia.

sexta-feira, 6 de março de 2009

cinco dificuldades para escrever a verdade IV

"(...) so many questions about the human condition, and they always dissolve to a single one: who am I?

and the answer to that question is: 'I am'.

when we are born we are given a name by which other people recognize us.
we are given a birth date to go along with the name, and we are told our gender.
then we are told the names of things and people surrounding us, subsequently we are told about the world, what is good and what is bad, what we are allowed to do and what not.
at some point, we will learn how to walk and explore the world on our own.
we will attain habits and learn to talk.
subsequently we will be told which religion we belong to, or if we have one.
and then at some other point, we will hear that we are going to die one day.
we are born and we die.
we will be told about god, about others who are different from us, which country we come from and what our people are called.
later we will be told other things too, more personal, more intimate things.
we will of course experience sensations and create ideas about what we are like, what the world is like.
we will start thinking, remembering, identifying ourselves with our ideas, our mind.
in short, we will become a person.
at this stage we already identify with the 'I-am-my-body' idea and this is where the suffering starts.
we take what we believe to know to be the true, to be an indisputable fact.
we believe things on hearsay and identify with them, we read about the world in books and newspapers, watch it on tv, we even believe to find proofs of our ideas in what surrounds us, we fantasize.

but where is this 'I' that I seem to know so well in the waking state, when I am sleeping?
where is this 'I' when I am dreaming?
and where is this ‘I’ when I’m in dreamless sleep? (...)"


jessie emkic


cinco dificuldades para escrever a verdade III

“what are you reading?” asks a man’s voice.
“arseny tarkovsky’s poems,” answers a woman in Italian.
“in russian?”
“no, it’s a translation... quite a good one.”
“throw it away,” the man says.
“why? the translator’s a very good poet,” she responds.
“poetry is untranslatable,” he continues, “like all art.”
“you may be right that poetry is untranslatable," she says, "but what about music? music’s for example...”
he interrupts her speech and begins to sing a tune in russian.
she smiles cynically: "what do you mean by that, what do you want to say?”
“it’s a russian song,” he replies.
“but how could we have got to know tolstoy, pushkin (without translation) and so understand russia?”
“none of you understand russia,” the man exhales.
“nor you italy then," she says, "if dante, petrarch and machiavelli don’t help."
"it's impossible for us poor devils," he utters.
"how can we get to know each other?" she asks him.
"by destroying frontiers."


in "nostalgia"
de andrei tarkovsky




quinta-feira, 5 de março de 2009

estática #2 (ela)

- não devia, não devia ter-te deixado entrar assim na minha vida. mas deixei. quando me telefonaste da primeira vez eu disse-te que sim como podia ter dito que não.
o tédio tem dessas coisas...
como tu já conheci muitos. tinhas um brilho qualquer, estavas cheio de ti, bebias demais... (isso eu só percebi depois....)
quando aquele primeiro jantar acabou, juro-te que senti alívio. e achei ridícula a tua insistência, mas deixei-te vir. estava um calor insuportável. eu chorava. não, não, eu queria chorar. mas tu não quiseste saber porquê. agarraste-me nos braços. não era em ti que eu pensava quando me distraía...
sim, os primeiros tempos foram bons. tudo tinha uma importância irreal. tu dizias muitas vezes que o nosso encontro tinha de ser breve para se manter belo. e tinhas razão.
começaste a ir e a voltar dois dias depois. depois três. depois mais. e eu, sem saber, agradecia. a vontade de estar foi diminuindo. quando não sabia o que dizer, e eram muitas as vezes, inventava. e quando a novidade deixou de o ser, o que sobrou era muito pouco. quase nada.
eu adio tudo tanto quanto posso. arrumar a casa, lavar a roupa, o trabalho, ir buscar aquele livro que tenho encomendado há semanas,… mas adiar a vida… e eu sei que estou a adiá-la. eu sei disso. (não sei não sei não sei nada) conheço cada vez mais gente. (eu acho que não conheço ninguém) e não sei o que faço, nem porque o ando a fazer, nem onde estou. (o que é que eu estou a fazer aqui?) mas continuo. quero andar para a frente. (eu tenho de parar) há coisas que se fazem que se desfazem. outras que não. amanhã volta tudo ao mesmo (fugir a tudo para trazer tudo de volta). tu ainda estás a dormir. eu vou deixar.
espero que oiças isto.

estática #2 (ele)

- não devia ter-te deixado entrar assim na minha vida. mas deixei. quando me telefonaste, daquela vez, disse-te que sim como podia ter dito que não.
o desejo tem dessas coisas...
como tu já conheci muitas. estavas cheia de vida, de vontades, fumavas imenso...
quando aquele primeiro jantar acabou, juro-te que o que senti foi um alívio inexplicável. achei um bocado patética a tua insistência mas deixei-te vir. chovia imenso. eu estava tão cansado... tu nem me deixaste tirar o casaco. agarraste-me nos braços. não era o teu nome que eu sussurrava entredentes...
sim, os primeiros tempos foram bons. tu estavas sempre a dizer que o nosso encontro tinha que ser breve para se manter belo. e tinhas razão.
começaste a ir e a voltar dois dias depois. depois três. depois mais. (menos telefonemas) eu agradecia. porque a vontade foi diminuindo. e eu não sabia o que te dizer a maior parte do tempo... e quando a novidade deixou de o ser, o que sobrou era muito pouco. quase nada.
eu adio tudo. arrumar a casa, lavar a roupa, devolver chamadas que considero importantes… mas sobretudo adio a vida. (a vida é uma coisa que não se deseja a ninguém) sim, sim, eu sei disso. (não sei não sei não sei nada) conheço cada vez mais gente. não sei o que faço, nem porque o faço. mas continuo. quero andar para a frente. (tenho de parar) há coisas que se dizem que se desdizem. outras que não. amanhã volta tudo ao mesmo. (fugir ao tédio para trazer o tédio de volta) tu ainda dormes. eu vou deixar.
espero que oiças isto. desculpa.

terça-feira, 3 de março de 2009

estática #1

– quando ela era nova, ela não se sentia bem com o seu corpo. quer dizer, ninguém lhe dizia que ela era bonita. e ela entrou na puberdade muito cedo.
– sim, eu lembro-me.
– depois encontrei-a uns anos mais tarde numa loja de roupa, daquelas caras, e ela disse-me que costumava ir para essas lojas e vestir as roupas mais caras para que as funcionárias lhe dissessem o quão bonita ela ficava com essas roupas. é óbvio que elas diziam que ela ficava linda porque elas querem vender. ela sabia disso.
– elas ganham comissões com essas vendas.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

naked (1993)

realização:
mike leigh
argumento:
mike leigh
fotografia:
dick pope
montagem:
jon gregory
música:
andrew dickson
com:
david thewlis
lesley sharp
katrin cartlidge
greg cruttwell
claire skinner
peter wight
ewen bremner
susan vidler

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

hotel chevalier



- have you slept with anyone?
- no. have you?
(pause)
- no.
- that was a long pause.
(silence)
i guess it doesn’t really matter.
- no it doesn’t.

[...]

- if we fuck, i’m gonna feel like shit tomorrow.

- that’s okay with me.


in
hotel chevalier
de wes anderson

sorry, but i'm in the wrong joke

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

the acceptance of absolute negation


- what's the worst thing you can imagine?
- chickens. small boys with chickens.



quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

de volta a setembro

porque isto não estava aqui.
e agora já está.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

cinco dificuldades para escrever a verdade II

1ª. ânsia.

2ª. desassossego.

3ª. apetite ( e é sobretudo sobre apetite que falo. uma espécie de concupiscência...).

4ª. prostração.

cinco dificuldades para escrever a verdade





"a necessidade de interrogar todas as coisas sobre o seu carácter transitório e variável.
(...) pois cada coisa depende de uma infinidade de outras que estão sempre a mudar: esta verdade é perigosa (...).
(...) por isso falam muito do destino.
mas é possível recusar os lugares comuns sobre o destino e demonstrar que é o homem que faz o seu destino."

bertolt brecht


domingo, 15 de fevereiro de 2009

sair

sinto que comecei no ponto em que acabaste.
(é tão injusta esta frase...)





















e agora já não há horas a mais dentro dos meus dias.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

entrar (esta orquídea viajou mil setecentos e quinze kilómetros)



acordar cedo. acordar tarde.
comprar o jornal. não ler o jornal.
os teus bilhetes espalhados pela casa.
ouvir-te dizê-lo. ver-te fazê-lo.

os meus dias têm horas a menos para tudo o que quero fazer contigo.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

a zed & two noughts (1985)


realização:
peter greenaway
argumento:
peter greenaway
fotografia:
sacha vierny
montagem:
john wilson
música:
michael nyman
com:
andréa ferréol
brian deacon
eric deacon
frances barber
joss ackland
jim davidson
agnès brulet
wolf kahler
e a voz de david attenborough

domingo, 8 de fevereiro de 2009

next time...


girl, if i sound like a wrecking ball, maybe it's because i am one.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

pequenas coisas que enervam muito #7

  • estar no segundo errado de uma história com dois segundos