segunda-feira, 7 de julho de 2008

os loucos


Os loucos, não os quero ver. Não tenho nada a ver com eles. Ponham-nos num mundo à parte, para que não nos venham chatear, com médicos se quiserem mas só para eles, um mundo fechado, bem murado, bem hermético, um outro mundo – que a gente os possa esquecer. É exactamente o que pretende fazer o asilo, é a esse desejo que ele responde: constituir um outro mundo estanque aonde a loucura fique isolada. No exterior, no mundo normal, apenas a razão, apenas o bom senso – no asilo, nada de sensato. O asilo purga, decanta, purifica, recolhe entre os seus muros toda a loucura do mundo. As grades do asilo separam, demarcam: lá fora o normal, no interior o patológico. Hoje já se suspeita que uma distinção tão marcada deve ter por vezes alguma coisa de abusivo, que nem tudo é assim tão certo nas pessoas “do exterior”, e que os que estão “dentro” talvez nem sempre sejam completamente malucos, que talvez haja, como dizem os americanos, que não se preocupam tanto com os conceitos, “partes sãs na sua personalidade”. É provável que essa dúvida sempre tenha existido, mas o homem tem necessidade de certezas, sentimo-nos melhor quando as coisas são nítidas. Por isso o sistema asilar não regateou despesas, e a psiquiatria entregou-se entusiasmada à tarefa de fabricar sintomas e de provar que se um tipo está internado é porque realmente não regula bem.

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